5.11.06

Seres rastejantes


A estréia de James Gunn na direção de longa-metragem é algo a se celebrar.

Ok, o sujeito já teve sua cota de cagadas na vida (alguém aí disposto a defender Scooby Doo 1 e 2?), mas sempre há uma chance para a redenção, mesmo pra alguém que teve a cara de pau de reescrever o roteiro de Dawn of the Dead.

Gunn tinha também sua cota de bons serviços prestados ao cinema, tendo estreado na função ao escrever o roteiro de Tromeo & Juliet, chez Troma/Lloyd Kaufman. Mas agora, como diretor, as coisas começam a entrar em perspectiva, promovendo o sujeito à categoria suspeita de promessa a ser confirmada.

Slither começa mostrando os dentes: um ataque escancarado, sem medo do grotesco (como cabe a um aluno de Kaufman), à América caipira, belicosa, e suas personagens macabras – um ricaço repulsivo; sua esposa interesseira, subserviente e frígida; autoridades débeis mentais; tristes mulheres oferecidas e famílias bizarras.

Que essas personagens encontrem seu destino chupando lesmas alienígenas, ou ainda que se realizem em conceitos de maquiagem absurdos e ícones do cinema subversivo (zumbis de Romero, Gregg Henry e Michael Rooker), é sinal de cabeça pensante – no cinema ianque, sempre algo a se celebrar.

Um ranço de nostalgia dos anos 80 não chega a deixar gosto amargo. Afinal, a referência aqui é um Joe Dante de Gremlins, um Tobe Hooper de Massacre da Serra Elétrica 2, um Romero de Dawn of the Dead (agora sim). Alto nível. É filme que se inscreve nessa moldura crítica, cínica, grosseira, de um olhar cáustico sobre as aflições da sociedade norte-americana. A começar pela referência à fonte (inesgotável nas ficções do gênero) do Lovecraft de A cor que caiu do céu.

Algum cuidado de produção, atenção ao ritmo (ainda que algo caótico e irregular às vezes), um gosto legítimo por tudo aquilo que faz uma boa matinê (até o dublê de Brandan Fraser funciona): uma bela receita, com ingredientes na medida para uma boa tarde de sábado chuvosa.

O DVD traz alguns extras que contribuem para completar a diversão, como o diário de Lloyd Kaufman e um gag reel.